Fonte: Gestão Educacional
Você já parou para pensar que fazer um pão é um processo químico ou que uma tela de computador é uma matriz de pontos? Ou, ainda, que por trás da construção de uma ponte ou de processos nos setores de energia elétrica, telecomunicações, agronegócio ou transporte aéreo está a matemática? Muito mais do que uma disciplina escolar, ela é peça-chave para o planejamento, a tomada de decisões e a produtividade em setores vitais da economia. Ou seja, o conhecimento de áreas ligadas às ciências exatas é crucial para o desenvolvimento do País. Por outro lado, há dificuldade no aprendizado e pouco interesse dos jovens em seguirem carreiras nessa área. Um levantamento feito pelo movimento Todos pela Educação, divulgado em 2013, mostra que só 10 % dos jovens brasileiros que concluem o ensino médio sabem matemática. Outro estudo revela que, até 2015, o Brasil precisará de 300 mil engenheiros, mas, segundo a Federação Nacional dos Engenheiros, o Brasil forma aproximadamente 38 mil engenheiros por ano e precisa de quase o dobro para dar conta da demanda. Também é grande o desinteresse em áreas como matemática, física e química, nas quais sobram vagas nas universidades.
Para o matemático Oscar Porto, diretor de Negócios da Gapso, empresa especializada em desenvolvimento de softwares corporativos para planejamento analítico de alta qualidade, é enorme a importância da matemática nos processos industriais dos mais variados setores, bem como para a vida pessoal dos indivíduos. “Uma pessoa que aprende matemática, independentemente do trabalho que exerça, adquire capacidade de raciocínio e outras características que facilitarão sua vida”, considera.
Porto destaca que a matemática é a base de setores ligados à inovação, como a tecnologia. “Por trás de um jogo [de videogame], por exemplo, há geometria avançada, geometria computacional, bem como em vários outros segmentos do dia a dia”, explica.
Apesar de seu imenso potencial e de sua extrema importância, a Matemática, bem como a Física e a Química, está entre as disciplinas mais temidas pelos alunos. O grau de dificuldade dos conteúdos acaba gerando falta de interesse, que, por sua vez, resulta no baixo nível de aprendizado. Na opinião de Porto, a forma de ensinar pode estar entre as causas desse cenário desanimador. “A matemática pode ser ensinada de maneira menos careta e de forma mais lúdica e muito mais divertida”, considera o matemático. Ele sugere que conteúdos como a teoria dos grafos e o teorema das 4 cores podem ser explorados de maneiras que permitam à criança brincar e, ao mesmo tempo, aprender a pensar. “Há alguns problemas da teoria dos grafos, por exemplo, que podem ser traduzidos em jogos. E o teorema das 4 cores, que pode ser aplicado por meio da atividade de colorir um mapa, é uma brincadeira matemática”, observa. E completa: “A matemática exige um pouco mais, mas se você incentivar as pessoas, ela será compreendida. Dizer que é ruim em matemática é uma questão cultural no Brasil que precisa ser mudada, a pessoa deve se envergonhar de ser ruim em matemática”.
Para Mario Donizete Domingos, gerente de Desenvolvimento de Produtos da Abramundo e curador científico do Instituto Abramundo, não há dúvidas de que a forma de ensinar pode cativar o aluno para a matemática e as demais disciplinas da área de ciências exatas. “Uma estratégia interessante é construir coisas, como [simular] a construção de uma ponte, a molecada adora construir”, comenta. Nesse processo, acrescenta Domingos, podem ser ensinados conceitos de força, resistência e outros pontos relacionados à matemática e à física. Já para ensinar química, ele sugere experimentos com reações químicas na cozinha. “Fazer um pão, ver crescer a massa, é uma reação química, e qualquer criança curte fazer isso”, afirma. Domingos chama a atenção para as novas tecnologias, que também possibilitam situações muito interessantes para o aprendizado das ciências. “Há várias alternativas com computação, robótica, arte e tecnologia e recursos mais avançados, como as impressoras 3D, que atraem a atenção dos alunos”, considera.
O que não dá, na opinião do especialista, é apresentar uma fórmula e mandar o aluno a utilizá-la. “Ninguém aprende com isso”, sentencia. Ele destaca que a matemática é uma linguagem e, como tal, é extremamente necessária para o aprendizado de outras disciplinas como a Física. “Se eu não sei matemática, eu não vou compreender física e também vou ter dificuldade em química e até em outras áreas”, adverte. E acrescenta que a contextualização do conteúdo deve ser voltada a situações do cotidiano dos estudantes. “Uma tela de computador, por exemplo, é uma matriz de pontos, que é um conteúdo do ensino médio. Primeiro os alunos devem olhar essa tela como uma matriz, verificar seu funcionamento e, depois, justificar a utilização prática desse conteúdo”, orienta.
Formação do professor
Domingos acredita que a formação e a preparação do professor das áreas de ciências exatas são fundamentais. “Preparar não é só dar formação, tem que dar qualidade de trabalho e recursos para esse professor”, destaca. São disciplinas que exigem ferramentas para o ensino, por isso não dependem apenas e exclusivamente do docente. “O professor é a peça central, mas não depende só dele”, avalia. Ele acredita que o desempenho da turma está nas mãos do professor, que não pode desistir de trabalhar conteúdos por causa das dificuldades dos alunos. “É preciso encarar as dificuldades e não se desestimular com as barreiras que surgem nesse processo”, diz.
O matemático Oscar Porto também acredita que o professor é parte importante no processo de estimular os alunos a se interessarem pelas ciências exatas, mas chama a atenção para outros aspectos. “Culpar o professor é uma saída fácil. Mas há outras questões a serem avaliadas: eles precisam ter uma formação melhor, ter reciclagem permanente, incentivos e melhor qualidade de vida”, acredita. Ele reforça que há muitas formas de ensinar matemática que são divertidas e, ao mesmo tempo, permitem um aprendizado profundo e são formadoras de pensamento matemático, “e que muitas vezes não são usadas, porque provavelmente os professores não são preparados para isso”.
Domingos sugere a adoção de metodologia de pesquisa científica para o ensino das ciências exatas e naturais desde as classes iniciais. “Eu crio hipóteses, eu desenho e realizo um experimento, eu tenho resultados, confronto com as minhas hipóteses e gero conclusões disso. É a melhor forma de aprender”, conclui. Ele observa que apenas seguir o livro didático e só dar a resposta, sem instigar a curiosidade, não é estimulante. “Tem que haver desafio, senão, se o aluno não tem afinidade, se ele não gosta do tema por algum motivo, ele vai se afastar disso”, avalia. O gerente acredita ainda que a pesquisa inserida desde cedo na vida do estudante o fará ter gosto por esse método, que pode acompanhá-lo até a universidade. “Até os alunos bem pequenos podem ser envolvidos em situações que incentivam a pesquisa. O professor faz um questionamento e, com base nele, o aluno cria uma hipótese, com base em sua visão de mundo”, ensina Domingos.
Porto comenta que o Brasil tem grandes referências na área da matemática, como o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), bem como grandes professores da área nas universidades. “O problema está no ensino básico. Todas as pessoas têm que ter uma formação mínima em matemática, para mim esse é o impacto mais sério para o País”, considera. E acrescenta:
“Se você não aprende, perde o interesse e isso – não ter uma formação razoável em matemática – tem impacto no dia a dia de pessoas de qualquer nível educacional. E se você não investe para melhorar essa formação [em matemática], no final da cadeia terá déficit de profissionais da área”, avalia.
Ele acredita que o Brasil teria muito mais matemáticos, físicos e químicos se tivesse incentivo e uma forma de fazer muito mais pessoas gostarem e aprenderem matemática desde crianças.
http://www.todospelaeducacao.org.br/comunicacao-e-midia/educacao-na-midia/29731/como-atrair-o-aluno-para-o-mundo-das-ciencias/