Canal do professor Julio Ríos, que ensina matemática, já teve 94 milhões de visualizações e chama a atenção do BID e de outros países
Julio Ríos é um fenômeno no YouTube. Mesmo sem fazer piada, dançar ou cantar, já alcançou a marca de 94 milhões de visualizações em seus vídeos. Também conhecido nas redes sociais pelo usuario julioprofe, este colombiano de Cali (cidade a 470km da capital Bogotá) usa videoaulas para ensinar matemática e física para quem ainda está no colégio ou acaba de chegar à universidade.
O canal no YouTube nasceu no começo de 2009, quando ele era professor particular de alunos de ensino fundamental e médio durante o dia e universitários à noite. “Percebia que alguns se distraíam durante as aulas e outros não conseguiam entender tudo na primeira explicação, por mais esforço que fizessem”, diz Julio. A inquietação o levou a ter contato com tutoriais disponíveis no YouTube e, para motivar seus alunos a chegarem às aulas já com perguntas, resolveu abrir o próprio espaço. Nascia ali o usuário julioprofe, uma identidade que também dá nome a um blog e a páginas no Facebook e no Twitter. O primeiro vídeo trazia ensinamentos de cálculo, disciplina que cobra dos estudantes base escolar para enfrentar conceitos de limites, derivadas e integrais. “Ele foi direcionado a adultos que tinham saído do colégio há três, cinco, dez anos e que haviam tido uma experiência traumática com a matemática”.
As gravações eram feitas com uma câmera digital simples, de 4 megapixels, colocada sobre um tripé. Tudo acontecia às 10 horas da noite, para não atrapalhar o sono de sua mulher e da filha mais velha. Mas achar tempo para produzir os conteúdos do canal não era a única dificuldade. “Não conhecia nada sobre programas de edição, o que me fazia subir o vídeo no YouTube do jeito que ele era gravado”. A ajuda da tecnologia, no entanto, permitiu uma resposta em tempo real dos resultados de cada vídeo, com comentários e curtidas vindos de todos os cantos da Colômbia e de outros países. Alguns testemunhos deixados no site ainda hoje emocionam Julio, como este trazido pelo próprio professor em evento promovido pela Samsung no último mês de dezembro: “Profe, em cinco minutos consegui entender o que levava duas semanas para acompanhar com meu professor”.
Julio desenvolveu a habilidade de ensinar desde muito cedo, segundo ele, graças a professores muito exigentes que teve durante a educação básica. “Eles fizeram com que eu me apaixonasse pela matemática e pela física e começasse a ensinar aos meus próprios colegas de classe quando tinha 15 anos. Eu me reunia com eles para fazer as lições de álgebra e geometria e descobri a facilidade para transmitir conhecimentos”, diz.
Em 1996, formou-se em engenharia civil e logo começou a trabalhar na área, mas não abria mão das aulas particulares. “Havia uma crise no setor de construção na minha cidade, as oportunidades eram poucas e os salários, muito baixos. Por isso, continuei com as minhas aulas”. Se por um lado faltavam espaço, por outro havia um grande público, ávido por aprender e superar os inúmeros problemas do ensino colombiano, muitos deles semelhantes aos do Brasil. “Na educação primária, existem professores ensinando matemática sem ter licenciatura específica para a disciplina”. Tal como aqui, a violência no país vizinho é outro fator a ser levado em consideração. “Quando não são os estudantes, são os os professores abandonam um colégio. É muito triste, mas é o que acontece. Há ordens de criminosos para que as aulas não aconteçam”, diz.
Da aritmética e álgebra, passou a expandir os conteúdos para cálculo, trigonometria e física, temas muito pedidos pelos próprio público. Atualmente, o canal tem 447 videos, 465 mil assinantes e caminha para os 100 milhões de vídeos assistidos, números que superam verdadeiros gigantes do ensino como Harvard, MIT e Stanford. “Cada vez mais pessoas estão fazendo uso das novas tecnologias, em especial de algo que não é tão querido, como a matemática”, avalia. A maior parte dos visitantes vem da Colômbia e do México, mas brasileiros também se deparam com o canal de Julio quando fazem buscas no site. “Recebo comentários em português e alguns também usam um tradutor para escrever palavras em espanhol. Fico feliz, porque até mesmo pessoas que não falam espanhol se beneficiam desse trabalho e isso mostra como a matemática é uma linguagem universal”.
“Aos seis minutos de explicação, a pessoa vai embora, seja porque já entendeu ou porque não gostou do vídeo”
Tamanho sucesso acabou por chamar a atenção do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que discute com o professor colombiano como dar maior alcance ao trabalho e como entender melhor o perfil do público que busca seus vídeos. “Algumas conclusões já saíram, como a que mostra que, aos seis minutos de explicação, a pessoa vai embora, seja porque já entendeu ou porque não gostou do vídeo. No futuro, vou buscar fazer vídeos cada vez mais curtos”. Em outra conquista importante, ministérios da educação da Colômbia, do Chile e da República Dominicana manifestaram intenção de usar os vídeos em suas redes de ensino.
De sua parte, Julio também avança. Em 2013, montou uma empresa chamada Academia Julioprofenet, onde oferece aulas presenciais e personalizadas de física e de matemática, além de cursos ao vivo. Adotando como lema “hacer el bien sin mirar a quien” (fazer o bem a quem quer que seja), Julio diz que seu maior objetivo é se colocar no lugar do estudante para que nada fique solto ou sem explicar. “Tudo tem que ter um porquê”, afirma. Para professores que queiram dar início a um canal próprio no YouTube, ele diz que o principal conselho é se aventurar. “Não sabia sobre vídeos. Aprendi. Não sabia como criar páginas de blog. Aprendi. Em algumas conferências, mostro como é o processo de gravação para que todos vejam que aqui não existe nada de outro mundo. Tudo é uma questão de se atrever a fazer e aproveitar os benefícios que a tecnologia traz”.