Cidade verde[1]
Dom Aquino Corrêa
Sob os flabelos reais de mil
palmeiras,
Tão verdes,
sombranceiras
E lindas
como alhures não as há,
Sobre
alcatifas da mais verde relva,
Em meio a verde
silva,
Eis a
‘cidade verde’: Cuiabá!
Guardam-na,
frente a frente, quais gigantes
Eternamente
amantes,
Os seus dois
morros, e tão verde são,
Que até refletem plácidos verdores
Nos lares
cismadores,
Que enchem
do vale a plácida mansão.
Muita vez,
na amplidão do céu ridente,
Que tão
macramente,
Sobre ela
curva o cérulo matiz,
Passa a
nuvem dos verdes periquitos,
Gárrulos e
infinitos,
Qual chusma
de esperanças infantis.
Passa!... e
na calma do horizonte verde,
Que além no
azul se perde,
Ela adormece
ao ósculo fugaz
Centrando a
barcarola
Infinita dos
beijos e da paz.
[1] Publicado
em Terra natal (1919), obra em que o amor à terra, a Deus e à natureza são
temas principais, o poema exalta, em forma de ode, a cidade em que nasceu e
viveu o poeta: Cuiabá. As estrofes sextilhas, combinadas em pares decassílabos
e versos de seis sílabas, garantem a cadência das imagens que desenham a
cidade. No quinteto final, o poeta conclui esse desenho na expressão de entrega
à visão contempladora da cidade já personificada. A palavra “verde”, já
presente no título, é retomada em todas as estrofes (“tão verdes”; “verde
relva”; “verde silva”; “cidade verde”; “verde são”; “plácidos verdores”;
“verdes periquitos”; “horizonte verde”), contribuindo para a plasticidade da
imagem poética. O azul que surge no poema (“céu ridente”, ‘cérulo matiz”)
perde-se ante ao verde majestoso da cidade que forma a imagem do “horizonte
verde”. O poeta preza pela palavra trabalhada esteticamente, aliando ao léxico
da paisagem cuiabana o léxico que remete à visão enaltecida pelos cronistas do
Brasil recém descoberto (“flabelos reais”; “alcatifa”; “plácidos verdores”).
Essa associação, do passado colonial ao presente, embeleza a cidade e atribui à
Cuiabá a grandeza majestosa da pátria cantada nos versos românticos. Cuiabá é
enaltecida em sua visão paisagística, engrandecida de tal forma que, ao fim do
poema, ganha a dimensão da cidade personificada que adormece ante a calma de
sua própria paisagem.
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