segunda-feira, 8 de abril de 2019

Poema Cidade Verde - Dom Aquino Corrêa

Cidade verde[1]
       
                       Dom Aquino Corrêa

Sob os flabelos reais de mil palmeiras,

Tão verdes, sombranceiras

E lindas como alhures não as há,

Sobre alcatifas da mais verde relva,

Em meio a verde silva,

Eis a ‘cidade verde’: Cuiabá!

Guardam-na, frente a frente, quais gigantes

Eternamente amantes,

Os seus dois morros, e tão verde são,

Que até refletem plácidos verdores

Nos lares cismadores,

Que enchem do vale a plácida mansão.

Muita vez, na amplidão do céu ridente,

Que tão macramente,

Sobre ela curva o cérulo matiz,

Passa a nuvem dos verdes periquitos,

Gárrulos e infinitos,

Qual chusma de esperanças infantis.

Passa!... e na calma do horizonte verde,

Que além no azul se perde,

Ela adormece ao ósculo fugaz

Centrando a barcarola


Infinita dos beijos e da paz.


[1] Publicado em Terra natal (1919), obra em que o amor à terra, a Deus e à natureza são temas principais, o poema exalta, em forma de ode, a cidade em que nasceu e viveu o poeta: Cuiabá. As estrofes sextilhas, combinadas em pares decassílabos e versos de seis sílabas, garantem a cadência das imagens que desenham a cidade. No quinteto final, o poeta conclui esse desenho na expressão de entrega à visão contempladora da cidade já personificada. A palavra “verde”, já presente no título, é retomada em todas as estrofes (“tão verdes”; “verde relva”; “verde silva”; “cidade verde”; “verde são”; “plácidos verdores”; “verdes periquitos”; “horizonte verde”), contribuindo para a plasticidade da imagem poética. O azul que surge no poema (“céu ridente”, ‘cérulo matiz”) perde-se ante ao verde majestoso da cidade que forma a imagem do “horizonte verde”. O poeta preza pela palavra trabalhada esteticamente, aliando ao léxico da paisagem cuiabana o léxico que remete à visão enaltecida pelos cronistas do Brasil recém descoberto (“flabelos reais”; “alcatifa”; “plácidos verdores”). Essa associação, do passado colonial ao presente, embeleza a cidade e atribui à Cuiabá a grandeza majestosa da pátria cantada nos versos românticos. Cuiabá é enaltecida em sua visão paisagística, engrandecida de tal forma que, ao fim do poema, ganha a dimensão da cidade personificada que adormece ante a calma de sua própria paisagem.


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