terça-feira, 29 de julho de 2014

Professores são capacitados para trabalhar projeto de cidadania com alunos

Foto: Jorge Pinho (SME)


Secom Cuiabá

Pelo menos 100 professores de escolas da rede municipal de educação de Cuiabá estão recebendo capacitação para trabalhar em sala de aula ações educativas que estimulam a cidadania, ética, democracia, responsabilidade social e respeito à diversidade. O curso de capacitação, dividido em dois módulos de quatro horas cada, ocorre na segunda e terça-feira (28 e 29).

O trabalho faz parte do projeto “Um por Todos e Todos por Um”, realizado pela Controladoria-Geral da União (CGU), em parceria com o Instituo Maurício de Sousa e a Prefeitura de Cuiabá.
Ao todo, 24 escolas municipais aderiram ao projeto, beneficiando aproximadamente 1,8 mil alunos do 4º ano. 
O trabalho com os alunos será realizado neste segundo semestre. Todos os participantes receberão um kit com material didático com os personagens da turma da Mônica. Cada kit contém caderno de atividades, revistas, cartazes educativos, jogos lúdicos e uma carteirinha do aluno que vai integrá-lo como “Agente da cidadania”.
Segundo o chefe da Controladoria-Regional da União de Mato Grosso, Sérgio Akutagawa, o projeto existe desde 2009 e surgiu com a finalidade de disseminar entre as crianças valores relacionados à participação social, democracia, autoestima, respeito à diversidade, responsabilidade cidadã e interesse pelo bem-estar coletivo. A intenção é que os alunos transmitam o que aprenderam aos pais, amigos e familiares, envolvendo toda a sociedade nesse processo.
“É um projeto de educação que tem por objetivo construir um futuro melhor. Para isso queremos fazer com que a criança entenda qual o seu o papel e a sua responsabilidade com o futuro do país. Ao final do projeto espera-se que as pessoas entendam que além de direitos, todos também têm deveres”, disse Sérgio Akutagawa.
Em 2009, duas escolas municipais de Cuiabá participaram do projeto e este ano a participação foi ampliada para 24 unidades.
Sérgio Akutagawa ressalta que os professores de Cuiabá foram privilegiados, pois enquanto as outras cidades do país receberam o curso de capacitação on-line, na capital de Mato Grosso a formação foi presencial e ainda contou com a participação da equipe do Instituto Maurício de Sousa.
A coordenadora de projetos do Instituto, Evelyn Cardia, lembra que o professor é a peça fundamental nesse processo, por isso é estimulado a trabalhar com os alunos. “Estamos otimistas quanto ao resultado e esperamos alcançar nossos objetivos”.
Para o roteirista das revistas em quadrinho da Turma da Mônica e do Instituto, Robson Barreto, que sempre trabalhou nos bastidores, ter esse contato direto com as crianças é uma experiência nova que está sendo muito especial. “O aluno é o maior agente desse projeto e é muito bom saber que estamos plantando uma sementinha em cada um deles, que logo será ampliada”.
Conforme a coordenadora de Formação da SME, Márcia Albieri, a parceria com a CGU vem fortalecer o trabalho que já é realizado na rede municipal de ensino. “Trabalhar a questão da cidadania com nossos alunos ajuda a formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres”.
Os professores estão empolgados com a participação no projeto. Para eles, a ideia de fazer com que os alunos aprendam de forma lúdica vai contribuir para o sucesso do projeto.
“Estou muito empolgada e feliz em poder participar de um projeto como esse, que tem por objetivo construir ética e cidadania dentro da escola”, disse a diretora da escola Lenine de Campos Póvoas, professora Taciane Garcez.

http://www.cuiaba.mt.gov.br/educacao/professores-sao-capacitados-para-trabalhar-projeto-de-cidadania-com-alunos/9293

Pesquisador lança livro sobre o povo Guarani

Da Redação - Isabela Mercuri
Foto: Reprodução
Pesquisador que esteve em Mato Grosso lança livro sobre o povo guarani
 “O que é, o que é – O pajé e as crianças numa aldeia Guarani?” é o nome do novo livro de Luís Donisete Benzi Grupioni, antropólogo que estuda os povos indígenas e fez pesquisa com os bororos em Mato Grosso. O livro acaba de ser publicado pela editora Moderna e conta a história dos pequenos índios, que conversam com o pajé e se entretêm em um jogo de adivinhação.

Leia mais: Com dois prêmios nacionais, poeta cuiabano lança livro na Academia Mato-Grossense de Letras

Este jogo, chamado Mbaravija, ou adivinhação, é muito apreciado pelos guarani, e consiste em fazer perguntas criativas e estimular os que estão à sua volta a responder. Falando da brincadeira, Luís Donisete apresenta os costumes e a cultura dessa tribo de maneira lúdica e divertida.

O que é, o que é? – O pajé e as crianças numa aldeia Guarani faz parte da coleção Girassol, que possui uma linguagem simples e divertida e é indicada para crianças já iniciadas no processo de leitura. A história estimulará os pequenos na leitura e ainda despertará a curiosidade por nossa cultura indígena.

Sobre o autor

Luís Donisete Benzi Grupioni nasceu e vive em São Paulo. Estudou Ciências Sociais na Universidade de São Paulo, onde fez mestrado e doutorado em Antropologia Social. Além de Mato Grosso, realizou pesquisa de campo entre os Zo'é e Tiriyó, no norte do Pará. Atualmente é coordenador do Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé), organização que atua entre os povos indígenas no Amapá e norte do Pará, e secretário-executivo de uma rede de cooperação entre organizações indígenas e indigenistas que trabalham na Amazônia (RCA).
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Avaliação docente

O predomínio da perspectiva da responsabilização em nível estadual acarreta consequências para as políticas educacionais, para as carreiras dos professores e, até, para o que acontece em sala de aula


Marta Avancini
 
Rayssa Coe
Catarina (à esq.) e Danielle: o professor está sendo tratado como apenas um elemento da cadeia produtiva

As avaliações docentes pautadas por bonificações concedidas com base nos resultados estão incorporadas às políticas educacionais da maioria dos estados brasileiros. É o que demonstra pesquisa realizada por Danielle Nogueira e Catarina de Almeida Santos, professoras e pesquisadoras do Departamento de Planejamento e Administração da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB).
Em 2012, as pesquisadoras coordenaram um levantamento nos sites e em documentos oficiais das secretarias de Educação dos 26 estados e no Distrito Federal, concluindo que 16 deles possuem processos de avaliação de desempenho baseados em resultados. Num primeiro momento, foi realizada uma investigação nos sites das secretarias estaduais de Educação, a fim de identificar a existência ou não de sistemas de avaliação de desempenho docente.
Confirmada a existência, as pesquisadoras fizeram uma análise de conteúdo dos documentos encontrados, destacando seus objetivos e a vinculação ao desempenho dos alunos nos processos avaliativos nacionais ou locais. “Buscamos entender se essas avaliações estavam voltadas para o desempenho profissional e progressão na carreira ou se o mote era a bonificação pelos resultados alcançados pelos professores e/ou alunos nas avaliações”, explica Danielle.
Os resultados evidenciaram que, em nível estadual, predomina a oferta de avaliações voltadas para a concessão de bonificações aos professores – seja pelo critério de desempenho dos alunos, seja pelos resultados alcançados pelas escolas frente a metas estabelecidas pelas próprias secretarias de Educação. E, mesmo em estados que não possuem avaliação docente, afirma a pesquisadora, o desempenho dos alunos nos exames oficiais (Prova Brasil, Saeb e avaliações locais) é usado como critério para bonificar os professores.
“A maioria das políticas de avaliação de desempenho docente se fundamenta na perspectiva da responsabilização, tanto como adesão a mecanismos de premiações quanto para monitoramento de metas por parte do Estado”, relata Danielle. “Nessa lógica, os mecanismos de premiação se apresentam de forma pontual, provisória e condicionada à avaliação”, complementa ela.
Responsabilização
Esses resultados foram analisados a partir de um referencial teórico que enfoca as relações entre avaliação, responsabilização, desenvolvimento profissional docente e reformas educacionais. Nessa medida, a análise enfoca o nexo entre as atuais políticas de valorização docente e as reformas educacionais, que vêm sendo implementadas no Brasil a partir dos anos 1980 e 1990.
O estudo se vale, como referência, de autores que se dedicaram aos quatro temas que percorrem a discussão: dentre outros, estão Abdeljalil Akkari – que trata sobre as reformas educacionais da década de 1980 –, Nigel Brooke, que enfoca a responsabilização, e Sandra Zákia, no campo da avaliação.
Há, então, três modalidades de responsabilização associadas ao desempenho docente, dependendo de como são aplicadas e das expectativas em relação ao comportamento do docente. Segundo Brooke, explica a pesquisadora da UnB, existe a responsabilização burocrática (procura a conformidade com as normas legais ditadas pela rede de ensino na qual o professor trabalha).
Uma segunda forma está relacionada com as normas formais e informais estabelecidas pelos colegas de profissão. “Assim, o professor é responsabilizado pela manutenção dos padrões da profissão perante seus pares”, diz Danielle. Na terceira forma, a responsabilização tem como base os resultados da escola. “Nela, o educador é responsabilizado perante as autoridades e o público em geral pela aprendizagem dos alunos. Além disso, as consequências, reais
ou simbólicas, são associadas às medidas usadas para aferir o desempenho dos alunos.”
Nesse sentido, as políticas de responsabilização, além de produzirem efeitos sobre os processos avaliativos dos sistemas educacionais, também influenciam no processo de profissionalização docente, quando passam a estabelecer padrões avaliativos de desempenho docente, enfatiza Danielle.
Paralelamente, o predomínio da perspectiva da responsabilização acarreta uma série de consequências tanto para as políticas educacionais, quanto para as carreiras dos professores e, até, para o que acontece na sala de aula. Isto porque elas servem de parâmetro para a qualidade da educação.
Qualidade em questão
A análise dos sistemas de avaliação docente ajuda a compreender as motivações que fundamentam as políticas de avaliação e de qualidade no Brasil. Para isso, é preciso lançar um olhar ao que vem ocorrendo nas últimas décadas.
A ascensão da perspectiva da responsabilização dos sujeitos – professores, mas, também, alunos – está diretamente ligada à forte expansão das avaliações em larga escala no Brasil, sobretudo desde os anos 1980. Naquela época, a qualidade do sistema era definida, principalmente, pelas avaliações em larga escala que evidenciam o desempenho de alunos em provas padronizadas (Saeb, Prova Brasil, por exemplo).
“Essas avaliações tenderam a determinar a qualidade da educação do Brasil, mas somente considerando uma dimensão do contexto escolar, o aluno”, conta a pesquisadora da UnB. Além de responsabilizar o aluno, a proliferação desse tipo de avaliação tende a delimitar o currículo nas áreas e conteúdos privilegiados pelos exames, em detrimento de outras dimensões também significativas para a formação escolar.
“Tivemos, portanto, um conjunto de políticas avaliativas que sustentavam uma concepção de qualidade que privilegia a performance institucional baseada em uma visão parcial da escola (nesse caso, somente sobre o aluno), tendendo a uniformizar as condições de aprendizagem e as características próprias dos sujeitos avaliados.”
Nesse cenário, as reformas trouxeram consigo um movimento de responsabilização pelos resultados obtidos nas avaliações – inicialmente dos alunos e, em decorrência disso, dos professores. “É nesse sentido que os efeitos da responsabilização acabam por induzir padrões de avaliação que levam ao ranqueamento de instituições, promovendo sistemas de premiação e punição.”
O professor como insumo
A responsabilização do professor pelo desempenho do aluno e pela qualidade da educação, nos moldes propostos pelas avaliações predominantes no Brasil, apresenta outro tipo de consequência: o tratamento do docente como um insumo, equivalente a um instrumento na cadeia produtiva, ao invés de ser tratado como um sujeito ativo no processo educacional, analisa a pesquisadora Danielle.
Como o objetivo são os resultados, nesta lógica, o professor precisa ser otimizado, a fim de gerar melhores resultados. “Pensando numa perspectiva produtivista, quanto melhores instrumentos o processo de produção dispuser, isso garantirá que seja eficiente e produza resultados mais satisfatórios. É o que acompanha uma tendência produtiva denominada de Qualidade Total.”
No entanto, é justamente nessa perspectiva que reside o cerne do problema, pois essa visão, defende Danielle, não condiz com o tipo de qualidade desejada na formação dos educandos: a qualidade socialmente referenciada, ou seja, aquela que atende às necessidades dos sujeitos e não do mercado.
Por isso, concluem as pesquisadoras, as políticas de responsabilização incorrem num equívoco, pois, dadas as suas características, pouco contribuem para fomentar o desenvolvimento profissional docente, bem como para melhorar a qualidade da educação – pois funcionam mais como um instrumento de enquadramento da prática, com critérios definidos externamente e unilateralmente.
Desta forma, o sistema avaliativo pode ser um agente que contribui para o desenvolvimento profissional docente numa perspectiva reflexiva, ao contrário da lógica de enquadramento da prática docente em critérios definidos sem a participação desse profissional, que vem predominando no Brasil. O resultado, conclui Danielle, é a intensificação do trabalho docente e o fomento de uma lógica quantitativa e parcial de qualidade, avessa à ideia da construção de uma qualidade socialmente referenciada.

Sobre as pesquisadoras
> Catarina de Almeida Santos: pedagoga pela Universidade Federal de Goiás (UFG), com especialização em Gestão Escolar, e mestre na área de políticas públicas de educação, na mesma universidade. Fez doutorado em políticas educacionais na Universidade de São Paulo (USP). É professora do Departamento de Planejamento e Administração, da Faculdade de Educação da UnB.
> Danielle Nogueira: licenciada em Educação Artística, com habilitação em Música pela Universidade do Estado do Pará (UEPA), cursou especialização na área de gestão educacional - Administração Escolar e Metodologia da Educação Superior. Fez mestrado e doutorado na área de políticas públicas e gestão na Universidade de Brasília (UnB), onde atua como docente e pesquisadora no Departamento de Planejamento e Administração da Faculdade de Educação.
http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/207/os-efeitos-da-avaliacaoo-predominio-da-perspectiva-da-responsabilizacao-em-318100-1.asp

O verdadeiro problema ortográfico

“Problemas de escrita não podem ser controlados por lei”, defende o linguista Sírio Possenti em sua coluna de julho, referindo-se ao novo projeto de reforma que tramita no Senado brasileiro com o fim de simplificar a ortografia.
Por: Sírio Possenti

Em ‘Ubaldo, Fidel e o lápis’, José de Souza Martins conta que João Ubaldo Ribeiro e ele tinham um interesse comum: o uso popular de palavras ‘novas’, “que chegam às pessoas comuns através da tevê, do rádio e da publicidade”. Informa que Ubaldo tinha uma ‘besteiroteca’, que incluía exemplos como “Parabéns grassa você é muito espessial”, “Deus potrêja esta casa”, “Vende-se filhote de lavrador”, “Vende-se colchão altopédico”.
Primeira observação: uma das coisas que mais me espantam é que intelectuais de alto gabarito não tenham informações elementares sobre questões elementares de linguagem, que estão em qualquer manual que um calouro de letras pode ler (em verdadeiras faculdades de letras, não em colegiões).
Além de provocar riso, esse material também pode ser visto como fonte de dados de extrema relevância para uma descrição mais acurada da nossa língua
Especialmente, me espanta que cacem basicamente erros de grafia e que não manifestem a menor capacidade de compreender o que se passa na cabeça de quem escreve errado. Só riem. Se levassem em conta, por exemplo, a escrita antiga (do tempo de Camões, digamos), imagino que sua avaliação mudaria completamente. Mas parece que nunca viram nenhum desses documentos, que só conhecem as atualizações. No máximo, lembram de ‘farmácia’ com ‘ph’...
Claro que se pode reagir humoristicamente aos exemplos citados (e a muitos semelhantes), que podem ser vistos nas ruas e, hoje, no Google, digitando placas do meu Brasil. Mas, além de provocar riso, esse material também pode ser visto como fonte de dados de extrema relevância para uma descrição mais acurada da nossa língua. Especialmente, já que a besteiroteca tem a ver basicamente com ortografia, uma análise desses materiais poderia iluminar debates sobre o tema.

Nova reforma?

Mal se implantam as regras do recente acordo ortográfico entre países lusófonos e já surge um movimento para fazer outra reforma, que simplificaria a ortografia. Ela seria mais uniforme (por exemplo, prescreve escrita uniforme para o fonema /s/, que sempre seria grafado com a letra ‘s’, o que resultaria em escritas como ‘sesta’ para as atuais ‘sexta’ / ‘cesta’ / ‘sesta’); e seriam eliminadas algumas “contradições” (‘estender’ e ‘extensão’, por exemplo).
Erro ortográfico
Exame da escrita popular e da produzida nos primeiros anos de escola revela vários tipos de erros ortográficos. Por isso, a questão não pode ser resolvida apenas com base na análise fonológica da língua. (foto: Eduardo Rodrigues/ Flickr – CC BY-ND 2.0)
Ora, qualquer análise da escrita popular e da produzida nos primeiros anos de escola mostra que os erros de grafia se dividem em diversos tipos: a) erros como escrever ‘casa’ e ‘exemplo’ com ‘z’, ‘caça’ com ‘ss’, ‘jeito’ com ‘g’ etc.; b) erros ligados a pronúncia variável (‘mininu’  (=menino), ‘curuja’ (=coruja), ‘anzou’ (=anzol), sem contar a famosa troca entre ‘mal’ e ‘mau’; c) juntar palavras separadas (‘serhumano’, com ou sem ‘h’) e separar palavras (‘ante posto’); d) acrescentar (‘apito’ = apto) ou tirar (‘habto’ = hábito) letras; e) eliminar ditongos (‘vassora’, ‘otro’, ‘pexe’) ou criá-los (‘professoura’, ‘bandeija’) etc.
Ou seja: uniformizar a grafia com base em análise fonológica não resolve o problema que se pretende resolver, porque se parte de duas hipóteses sem nenhum fundamento: a) que todos os falantes adotam a mesma pronúncia; b) que o único problema é a relação letra/fonema. Ora, como os poucos exemplos mostram, os problemas são mais numerosos e nenhuma reforma pode resolvê-los.

Saídas para uma escrita melhor

Os exemplos de João Ubaldo revelam alguns aspectos mais complexos. Se ‘espessial’ assinala um problema desses que qualquer um consegue mencionar, nem toca no problema que surge na escrita de palavras menos conhecidas.
O exame de casos mostra que uma das soluções do escrevente é associá-las a palavras conhecidas, como no caso de ‘altopédico’, mais ou menos misteriosamente associado a ‘ortopédico’, um provável exemplo de etimologia popular: sendo ‘orto’ uma forma desconhecida, é associado a ‘alto’, forma conhecida. Pela mesma razão, escreve-se ‘lavrador’ por ‘labrador’.
Mesmo uma fonologia elementar, ‘aplicada’ à escrita, tem excelentes explicações para grafias como ‘malmita’, ‘agricula’, ‘chapiação’, ‘conzinheiro’, ‘viaigi’, ‘almusar’ (para o ‘u’, no caso), ‘afiace’ (afia-se), ‘dilícia’, ‘difisiu’ (difícil).
O que têm em comum todos esses casos, citados em O português popular escrito, de Edith Pimentel Pinto, é que não seriam atingidos por uma reforma que simplificasse a ortografia, porque sua origem não é a grafia legal diversa para o mesmo fonema nem uma pequena contradição local.
Leitura
Experiência com leitura e escrita é a única saída para superar as dificuldades ortográficas. Quem frequenta boa escola e escreve com regularidade geralmente não apresenta problemas graves de grafia. (foto: Camila Hermes/ Flickr – CC BY-NC 2.0)
O que origina essas grafias é uma hipótese elaborada por um escrevente com pouca escolaridade e, consequentemente, com pouca familiaridade com a escrita. O que indica a única saída para uma escrita melhor, desse ponto de vista: escola melhor e maior contato com a escrita.
Quem tem acesso a uma boa escola e escreve regularmente não tem problemas (graves, pelo menos) de grafia. Nem no Brasil, nem na França ou Inglaterra, países em que se falam línguas cuja escrita está bem longe da fala.
A única saída para uma escrita melhor é ter uma escola melhor e um maior contato com a escrita
Se projetos de reforma como o que tramita em Comissão do Senado forem levados adiante, pouquíssimos problemas de escrita que se encontram na escola e nas ruas serão solucionados. Simplesmente porque suas principais causas – a diversidade de pronúncias e as hipóteses dos escreventes – não podem ser controladas por lei.

Se a solução é óbvia, os caminhos para chegar a ela são conhecidos dos especialistas. Mas, infelizmente, são completamente desconhecidos não só pela ‘sociedade’, mas mesmo por representantes das letras de alto gabarito (e por senadores supostamente menos iletrados), como o revela a besteiroteca mencionada anteriormente.

Sírio Possenti
Departamento de Linguística
Universidade Estadual de Campinas

http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/palavreado/o-verdadeiro-problema-ortografico

Declaração para um novo ano

20 para 21  Certamente tivemos que fazer muitas mudanças naquilo que planejamos em 2019. Iniciamos 2020 e uma pandemia nos assolou, fazendo-...