Educador espanhol Antoni Zabala diz que soluções digitais não podem ser pensadas para inovadores, mas para quem ainda é tradicional
Em um mundo cada vez mais globalizado, utilizar as novas tecnologias de forma integrada ao projeto pedagógico é uma maneira de se aproximar da geração que está nos bancos escolares e potencializar processos de aprendizagem através da
personalização do ensino. Essa é a opinião de Antoni Zabala, diretor da Revista AULA de inovações educativas, fundador de Campus Virtual de Educação da Universidade de Barcelona e referência mundial em formação docente e reforma curricular.
Durante a 12º Congresso Internacional de Tecnologia na Educação, realizado em Recife entre os dias 17 e 19 de setembro, o teatro principal do Centro de Convenções de Pernambuco viu seus quase 4500 lugares ocupados por educadores interessados na palestra “Tecnologia em sala de aula: uma solução ou um problema?”, capitaneada por Zabala. “Espera-se que os educadores solucionem todos os problemas da sociedade, mas não oferecem ferramentas para isso. E quando oferecem, o fazem sem preparo. Assim, o que poderia ser útil se torna um obstáculo”, comentou Zabala ao descrever um constante problema enfrentado por educadores que são estimulados a usar computadores e ferramentas digitais em suas aulas.
Para ele, a maioria das soluções digitais do ensino tem como público principal o professor inovador, mas a realidade é que grande parte do corpo docente ainda é tradicional e utiliza métodos tradicionais de aprendizagem, o que se apresenta como uma grande incoerência. O erro seguinte é esperar que o professor seja inovador para só então ser capaz de utilizar as TICs em suas metodologias. “O professor pode não ser inovador a priori, mas a tecnologia pode catalisar a inovação que existe naquele professor, ainda não aflorada”, destaca.
Outro ponto relevante salientado pelo educador espanhol é referente às diferenças que existem entre os membros do professorado. Da mesma forma que se fala da personalização do ensino, é preciso falar dos distintos perfis do profissional. “Cada aluno é um individuo, aprende e interage no seu ritmo. E cada professor terá particularidades no processo de transição dos modelos analógicos aos digitais. Para que seja eficaz, essa transição deve ser vista como um processo gradativo, passo-a-passo”.
Especialista na utilização das tecnologias, Antoni Zabala deu uma breve entrevista sobre os desafios da educação e como a tecnologia pode ser uma aliada do professor e dos alunos. Confira abaixo:
O senhor acredita que existem dois principais desafios para o professor e a educação: a formação integral do indivíduo e o desenvolvimento de competências. A tecnologia pode ajudar a superá-los?
A primeira questão é definir quais são as competências que devem ser desenvolvidas para o futuro do cidadão, que tem a ver com a sua habilidade de resolução de problemas. Entre essas competências, está o domínio das técnicas, que não implica conhecer a fundo a tecnologia ou programar, mas conhecer as possibilidade que a tecnologia oferece e como manejar a informação e o conhecimento, interpretar, intercambiar.
“Por que as pessoas não querem ir a um hospital que utiliza modelos antigos mas aceitam a ideia de uma educação de antiga?”
Além disso, temos a questão da atenção à diversidade. Cada aluno aprende de uma forma. Para o professor é muito difícil conhecer a fundo e dar ajudas específicas a cada aluno dentro das suas peculiaridades E é aí que as diferentes soluções digitais tem um papel, pois elas podem fazer o ‘trabalho sujo’ do professor, de uma forma que libere o profissional do que até agora era fundamental, como avaliar o processo, passar as informações, corrigir provas… Isso a máquina pode fazer. Mas, por exemplo, o que a máquina não pode é compreender o motivo de um aluno aprender mais ou menos, isso ou aquilo, e propor soluções e otimizem o aprendizado. E aí vem a responsabilidade do professor.
É possível ser um professor inovador em centros de ensino e sistemas tradicionais, com pais de alunos que ainda têm uma mentalidade tradicional acerca da educação?Se o professor está sozinho em uma instituição assim, eu diria ‘busque pessoas, colegas que compartilhem do que você acredita, não continue só’. Com grupos maiores, é possível gerar movimentos que mudam mentalidades. Já com os pais, é bem fácil. É apenas uma questão de comunicação.
Fácil?Sim! Temos bons argumentos, então basta fazer uma boa comunicação. Por exemplo, se um pai ainda resiste a um modelo de ensino e educação mais inovador, eu lhe perguntaria: “O senhor gostaria que atendessem ao seu filho dentro das necessidades pessoais dele? Ele dirá ‘sim’. O senhor deseja que seu filho saiba falar, racionalizar? Claro que sim. Quer que ele se torne uma pessoa solidária, colaborativa? Pois a única maneira de garantir isso é trabalhar um modelo que vá além do tradicional”. Claro que o próximo passo é apresentar os resultados.
“O professor pode não ser inovador a priori, mas a tecnologia pode catalisar a inovação que existe naquele professor, ainda não aflorada”
Acredito também que existe uma responsabilidade dos meios de comunicação, de divulgar e discutir esses novos modelos e os resultados que deles surjam. Isso facilitaria o trabalho do professor. As famílias e as escolas precisam entender que o modelo antigo não funciona mais. Por que as pessoas não querem ir a um hospital que utiliza modelos antigos mas aceitam a ideia de uma educação de antiga?
Além da personalização, sabemos que existem utilizações da tecnologia como ferramenta de inclusão. Ou seja, que estão permitindo que pessoas com deficiências, ou que moram em regiões afastadas, ou que vem de famílias em desvantagem econômicas, por exemplo, tenham acesso a um aprendizado mais democrático. Existem resultados concretos nessa linha?
O princípio básico é o mesmo: dar ao aluno o que ele necessita para a sua formação plena. No caso de ferramentas inclusivas, o aluno necessita superar barreiras que talvez grande parte das crianças e jovens não necessite. Nesses casos, a tecnologia abre possibilidades infinitas! Vou te dar um exemplo bem prático. No meu instituto, criamos um aplicativo com um sistema que identifica as características diferenciadas de cada aluno e oferece atividades com base nessas características. Isso já é possível. E em 10 anos, tenho certeza de que poderemos estender a quaisquer alunos, com os mais diversos perfis.
* Isabela Carvalho é jornalista, com especialização em Comunicação com Fins Sociais, e coordenadora de Redes do Changemakers da Ashoka, que lançou, em parceria com o Instituto Embratel Claro, o desafio Tecnologia é Ponte: diminuindo as distâncias na educação”, que tem o objetivo de identificar a oferecer suporte a projetos que usam as TICs como ferramenta de inclusão para jovens e crianças em idade escolar. As inscrições estão abertas até 22 de outubro e devem ser feitas através do site www.changemakers.com/tecnologiaponte.
Veja Mais: Antoni Zabala: Desafios globais
http://porvir.org/porpensar/tecnologia-catalisa-inovacao-existe-professor/20140929