Estudo da organização KnowledgeWorks analisa como o avanço da inteligência artificial, dos algoritmos e da neurociência vai mudar a aprendizagem e o relacionamento entre as pessoas
por Vinícius de Oliveira
A virada do ano é uma época comum para fazer previsões de todos os tipos, inclusive para a educação. Um dos mais recentes documentos neste sentido foi publicado recentemente pela organização sem fins lucrativos KnowledgeWorks, que reuniu especialistas para pensar o futuro do ensino e da aprendizagem para os próximos dez anos.
Esses serão tempos marcados pela interação cada vez maior entre indivíduos, máquinas inteligentes e algoritmos, o que vai demandar mudanças nas relações interpessoais e na comunicação com as instituições. Como resultado, todas as dimensões de nossas vidas serão impactadas e isso também diz respeito ao que acontece na escola. O estudo “Navigating the Future of Learning: Forecast 5.0″ (“Navegando pelo Futuro da Aprendizagem: Previsão 5.0”) oferece ainda a educadores e gestores questionamentos para que sejam traçadas ações tendo em vista a situação da sala de aula no futuro.
Da mesma forma que já discutimos outras vezes aqui no Porvir, o estudo da KnowledgeWorks também parte do princípio que o modelo atual de ensino não atende às demandas futuras da sociedade. É por isso que a educação terá um papel importante para o desenvolvimento saudável dos jovens, que precisam incorporar uma mentalidade de aprendizagem ao longo da vida para fortalecer suas comunidades. A nova era, diz o texto, “pode exacerbar o atual desalinhamento ou inspirar novas estruturas de como vivemos, trabalhamos e aprendemos”.
Neste cenário, o documento identifica cinco fatores que vão impulsionar mudanças nos próximos 10 anos: automação, tecnologias que afetam o funcionamento do cérebro, narrativas tóxicas sobre sucesso e realização pessoal; mudança na estrutura de comunidades e o trabalho de “superpotências civis”, sejam elas indivíduos, organizações sem fins lucrativos ou voluntárias, que vão atuar com foco em corrigir e atender lacunas deixadas pelo poder público.
Entre os cinco pontos, vale a pena destacar um que traz novidades em relação a outros estudos recentes. Um deles diz respeito ao uso de tecnologias para melhorar o funcionamento do cérebro. No documentário “Take Your Pills: Receita para a Perfeição”, da Netflix, alunos de grandes faculdades dos EUA se mostram dependentes a estimulantes vendidos com receita médica, como o Adderall, que prometem ajudar no desempenho cognitivo. E se a tecnologia for criada para um efeito semelhante? Elas podem estar disponíveis de forma desigual, permitindo que apenas alunos mais ricos sejam beneficiados. E mesmo que estejam amplamente disponíveis, educadores podem ter que considerar os limites éticos para uso desses aplicativos ou dispositivos em sala de aula.
Por mais que seja um exercício de futurologia, os responsáveis pelo estudo argumentam que à medida que o cenário de mudança ganhar fôlego, vão aparecer novos tipos de práticas, programas, estruturas e papéis dentro da educação. Entre eles, podem ser destacados quatro, que guardam alguma similaridade com as competências da BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e com o conceito de educação integral:
– Aprendizagem centrada no aluno: reorientar os sistemas de ensino e aprendizagem, expectativas e experiências com objetivo de colocar ao centro o desenvolvimento integral do aluno. Educadores poderiam enfatizar em seu trabalho a promoção da expressão criativa, do autoconhecimento e pertencimento social. Especialistas e educadores podem trabalhar juntos para integrar o conhecimento da neurociência, aprendendo ciências e tecnologias cognitivas em experiências de aprendizagem que apoiam o desenvolvimento cérebro e melhoram a função cognitiva e o bem-estar do aluno.
– Ecossistema de aprendizagem: colocar o aprendizado integrado à tecnologia, cultura, aluno e comunidade para ampliar oportunidades. Por exemplo, em museus, parques, centros de ciência ou negócios onde as experiências educacionais são intencionalmente projetadas com tutores ou membros da comunidade em realidade virtual ou ambientes de realidade mista.
– Garantia de eficiência: oferecer visão e orientações a gestores para implementar estratégias de dados e de uso de tecnologia.
– Amplificação de vozes: reconfigurar modelos de engajamento e canais de comunicação para ampliar a capacidade individual e o impacto na comunidade. Isso seria possível com professores conscientes da possibilidade do uso de ferramentas de aprendizado de máquina para criar e promover recursos e aplicações abertas, a fim de atender às necessidades específicas dos alunos. Da mesma forma, é necessário oferecer formação aos alunos para que eles tenham voz e exerçam influência cívica através do uso ético e responsável de ferramentas digitais.
No entanto, para que os conceitos não fiquem apenas na teoria, a parte final o estudo apresenta uma lista de programas que já colocam iniciativas em prática. O site traz ainda recursos para quem quiser se aprofundar nos temas.