Escrito por Luciana Allan
“Os professores podem ser substituídos por uma máquina”. “As escolas como as conhecemos estão obsoletas”. As duas frases, a primeira proferida na Campus Party, em São Paulo, em 2012, e a segunda na TED, na Califórnia, em 2013, são de autoria de Sugata Mitra, professor da Newcastle University, na Inglaterra, e um dos maiores especialistas do mundo em tecnologia educacional. Os pensamentos do professor Mitra são a síntese das transformações que estão desafiando os modelos pedagógicos desenhados há centenas de anos para formar aprendizes que até recentemente eram estimulados a, exclusivamente, repetir e decorar informações, e não a aprender com base em suas próprias descobertas.
Há tempos que a neurociência vem investigando como o cérebro consegue se desenvolver quando estimulado e criar novas conexões à medida que adquirimos mais conhecimentos ao longo da vida. Aplicada no campo da educação, diversos estudos indicam que os nativos digitais já não retêm mais informações e conceitos como seus pais e avós, que seguiam uma mesma cartilha e metodologia de ensino, e que o desenvolvimento de suas habilidades cognitivas ocorre de maneira muito mais independente, ou seja, eles têm maior capacidade de aprender sozinhos.
Impossível não vincular o nascimento de uma nova geração de aprendizes ao surgimento das novas tecnologias digitais, que passaram a disponibilizar informações a qualquer hora e em qualquer lugar. Se antes o professor exercia seu poder sobre a classe porque era o único detentor do saber, hoje basta que o aluno faça uma rápida pesquisa no celular ou em outra mídia para acessar respostas e conteúdos didáticos de qualquer disciplina.
A partir do final dos anos de 1990, o professor Mitra realizou diversas experiências em comunidades pobres da Índia, disponibilizando computadores com acesso à internet a crianças que nunca tinham visto um PC e sem passar nenhuma orientação de como usá-los. Descobriu que, mesmo sem a presença de um professor, elas conseguiram aprender inglês e questões complexas como a replicação do DNA.
Atualmente, Mitra está mergulhado em um projeto de criação de “escolas na nuvem”, nas quais os alunos, conectados e guiados por professores-mentores, que trarão propostas de discussão de temas diversos, estarão no comando da aprendizagem e irão compartilhar a distância o que sabem, ajudando na formação de outros estudantes, mesmo os que vivem em regiões remotas.
Já não nos impressionamos com crianças de dois anos que mexem intuitivamente em um tablet ousmartphone. Seria inócuo negar os benefícios que a tecnologia pode trazer à formação dos futuros profissionais, que, mais do que saber ler, escrever e fazer as quatro operações matemáticas, precisam desenvolver a inteligência emocional, entre outras habilidades.
Mas qual é o perfil dos professores contemporâneos? Estão mesmo sendo substituídos por máquinas e a escola passando a ter seus dias contados para fechar as portas? Certamente que não. Com um universo cada vez maior de conteúdos armazenados em grandes bancos de dados, que podem ser interconectados para estruturar novas redes de conhecimento, a eles cabe, cada vez mais, o importante papel de tutoria e de identificar os potenciais de seus alunos para adaptar o aprendizado de acordo com os interesses e as habilidades de cada um.
Jean Piaget já antecipava a visão de pensadores como o professor Mitra muito antes de a tecnologia derrubar as paredes das salas de aula: “A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda é formar mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe”.
As tecnologias educacionais têm sido, sem dúvida, essenciais para repensar modelos pedagógicos obsoletos e ajudar os professores a finalmente conduzir seus alunos a alcançar seu potencial pleno, e não mais formar clones que se contentam em aprender o que irão esquecer logo depois das provas. Mas sem a orientação de seus tutores, corremos o risco de formar uma geração de distraídos que não sabem o que fazer com avalanches de informações.
Artigo publicado na edição de fevereiro de 2015.
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