Por que os grandes educadores brasileiros não inspiram o labor das escolas
José Pacheco
Anísio Teixeira |
Era uma vez...duas escolas, lado a lado a um córrego poluído. Por décadas, essas escolas deram aula de educação ambiental a alunos moradores de palafitas precariamente edificadas sobre o córrego. Até que uma das escolas alterou o seu modus operandi e os efeitos não se fizeram esperar. Jovens desmotivados motivaram-se, empreenderam freirianas leituras do mundo, o rendimento acadêmico melhorou, a comunidade estreitou laços com a escola, a recuperação do córrego começou.
O fenômeno gerou curiosidade. E o secretário de Educação quis saber a origem do inusitado projeto. Apercebeu-se de que, a par dos benefícios, era menor o custo. Membros da comunidade que acompanhavam o projeto dessa escola faziam-no gratuitamente.
No primeiro encontro com a secretaria, um dos educadores fez uma crítica construtiva e fundamentada ao modo como a formação vinha sendo realizada, por induzir os professores à reprodução de um obsoleto modelo de escola. As técnicas da secretaria responsáveis pelo setor da formação foram fazer “queixinha” ao seu chefe. O chefe, por sua vez, queixou-se ao secretário. E o senhor secretário mandou suspender o projeto.
Cansei-me de assistir à destruição de projetos por via de caprichos de governantes, da incompetência de funcionários, da sanha persecutória de burocratas. A falta de conexão com as realidades de comunidades não prejudica apenas o desenvolvimento cognitivo dos jovens – afeta negativamente o exercício da cidadania e sedimenta a submissão a um modelo excludente de sociedade.
Houve quem tentasse dar sentido à escola sem sentido. No tempo dos mestres Anísio, Agostinho, Lauro, Darcy, Freire, o Brasil parecia encaminhado para a melhoria da qualidade da sua educação. Perdemo-nos por descaminhos. Freire foi traído. E o conservadorismo pedagógico alia-se a um poder destituído de saber. As medidas de política pública continuam assentes na crença de ser possível melhorar aprendizagens sem que se processe a reconfiguração das práticas escolares, sem que surjam novas construções sociais de aprendizagem. Ou em equívocos como o de crer na despoluição de um córrego sem que os herdeiros de Freire devolvam as escolas às comunidades, de onde a modernidade as exilou.
Durante o período negro dos governos militares, o Rubem – que neste fatídico julho nos deixou órfãos – e outros brilhantes pensadores exilaram-se, e muitos projetos pereceram. O Rubem conduziu-me à descoberta de Anísio, que defendia a necessidade de mudar a escola, para que esta se tornasse um instrumento de mudança social. Levou-me ao encontro da Nise, do Florestan, da Nilde, do Lauro e de um íntimo Freire, sobre cuja integração na ortodoxa universidade o Rubem escreveu um “não parecer”...
A morte do mestre Rubem significará um novo exílio? Fico perplexo pela morte da memória do Anísio e por ver Freire sequestrado nos arquivos de teses das universidades, quando sua obra deveria inspirar o labor dos educadores e das escolas brasileiras. Que país é este, que mantém no exílio os seus maiores educadores?
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