As tecnologias da comunicação e o mundo digital estão alterando profundamente a dinâmica da vida em sociedade. Sociedade pós-humana, cultural digital, convergência das mídias, linguagem ubíqua, hipermídia, hipertexto. Por mais que esses termos estejam presentes no cotidiano, inclusive na educação, eles são ainda muito nebulosos.
A entrevistada desse mês da Plataforma do Letramento tem lançado, durante toda sua trajetória como pesquisadora, reflexões e profundas análises sobre as linguagens humanas, os meios e suas transformações. Tem acompanhado de maneira muito próxima a relação das tecnologias digitais e suas influências culturais na sociedade. “Ela tem um currículo tão grande que é capaz de travar o navegador de quem o acessa na internet”, disse o ator e apresentador Antônio Abujamra para descrevê-la em sua entrevista no Programa Provocações, exibida em junho de 2010 na TV Cultura.
Natural de Catanduva, interior de São Paulo, Lucia Santaella é uma das pesquisadoras brasileiras com maior reconhecimento no meio acadêmico, não só nacional como mundial. É professora titular no programa de pós-graduação em Comunicação e Semiótica e coordenadora do programa de pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Tem mais de 20 livros publicados, mais de 200 artigos em periódicos nacionais e internacionais. Em 2011, recebeu o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro (CBL), pelo livro A ecologia pluralista da comunicação.
O reconhecimento acadêmico e intelectual da professora pós-doutora é inegável, principalmente na área de semiótica e comunicação. Seu último livro, Comunicação ubíqua: repercussões na cultura e na educação, lançado em 2013, traz importantes reflexões e inquietações sobre a área da educação.
Para Santaella, a revolução digital não está apenas transformando os formatos de comunicação. Entre outros aspectos, seus estudos apontam para a necessidade permanente de reflexão sobre as modificações pelas quais o ser humano vem passando em contato com as tecnologias, modificações “não apenas mentais, mas também corporais, moleculares” (SANTAELLA, 2003, p. 31).
Diante desse contexto, o “digital” está criando uma nova linguagem humana, que mistura o visual, o verbal e o sonoro. No que ela chama de mundo pós-humano, a comunicação não depende mais de diferentes suportes, como o papel, a TV, o rádio, pois o ciberespaço se apropria de todas as linguagens anteriores, criando uma identidade própria e lhe dando uma nova configuração.
Quais são os desafios da escola na tentativa de acompanhar tantas mudanças? Como se comunicam, aprendem, interagem os alunos que estão chegando às escolas hoje? Na entrevista a seguir, Lucia Santaella fala das tecnologias da linguagem, das modificações que sofreram ao longo do tempo e dos desafios lançados aos educadores e à escola diante do atual cenário das convergências das mídias, da revolução digital e da relação mutante do humano com a máquina.
Plataforma do Letramento: Que desafios as novas tecnologias impõem aos educadores em sua formação?
Lucia Santaella: Tecnologias que importam para a educação são tecnologias de linguagem. A primeira tecnologia de linguagem é o aparelho fonador, que se instalou em nosso próprio corpo por uma questão de sobrevivência adaptativa da espécie humana. Era essa tecnologia que se empregava nas sociedades tribais para a transmissão das narrativas necessárias à preservação de suas culturas. Um grande avanço se deu com a implantação do alfabeto no mundo grego, quando se instaurou a escrita no mundo ocidental. É devido a isso que estamos lendo os gregos até hoje. Outro avanço ocorreu com a invenção da prensa manual de Gutenberg (em meados do século XV), que possibilitou a criação disto que passamos a chamar de livro: linguagem impressa em folhas sequenciais de papel encadernado. A explosão do livro viria com a revolução industrial no século XIX, que permitiu a aceleração da impressão em máquinas rotatórias. Foi também no século XIX que surgiu o modelo de escola que atravessou uma boa parte do século XX, um modelo cada vez mais adaptado ao desenvolvimento de competências e especializações para atender às necessidades do mercado de trabalho capitalista. Trata-se de um modelo escolar baseado na atomização dos campos do conhecimento e centrado no saber do professor e na transmissão desse saber por meio de exposições orais e livros-textos.
Com o advento do rádio e da televisão, que são meios não apenas noticiosos, mas, sobretudo, de entretenimento, a escola e especialmente o livro começaram a sofrer a competição dessas tecnologias de linguagem mais rápidas e mais afeitas a repertórios de informação médios, inclusive acessíveis a pessoas de baixa escolaridade. Essa competição não chegou a abalar o modelo escolar vigente. Ambos passaram a conviver em paralelo. Foi essa época que viu nascerem processos de ensino complementares via TV educativa, com eficácia bastante discutível. Foi só a partir dos anos 1990, quando a cultura do computador passou a cada vez mais fazer parte da vida da sociedade em geral, que surgiriam as grandes revoluções nas tecnologias de linguagem, com o manancial de desafios que estão trazendo para os modelos tradicionais de educação.
Clique para continuar lendo: http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista-entrevista-detalhe/651/lucia-santaella-novas-linguagens-e-a-educacao.html
Para Santaella, a revolução digital não está apenas transformando os formatos de comunicação. Entre outros aspectos, seus estudos apontam para a necessidade permanente de reflexão sobre as modificações pelas quais o ser humano vem passando em contato com as tecnologias, modificações “não apenas mentais, mas também corporais, moleculares” (SANTAELLA, 2003, p. 31).
Diante desse contexto, o “digital” está criando uma nova linguagem humana, que mistura o visual, o verbal e o sonoro. No que ela chama de mundo pós-humano, a comunicação não depende mais de diferentes suportes, como o papel, a TV, o rádio, pois o ciberespaço se apropria de todas as linguagens anteriores, criando uma identidade própria e lhe dando uma nova configuração.
Quais são os desafios da escola na tentativa de acompanhar tantas mudanças? Como se comunicam, aprendem, interagem os alunos que estão chegando às escolas hoje? Na entrevista a seguir, Lucia Santaella fala das tecnologias da linguagem, das modificações que sofreram ao longo do tempo e dos desafios lançados aos educadores e à escola diante do atual cenário das convergências das mídias, da revolução digital e da relação mutante do humano com a máquina.
Plataforma do Letramento: Que desafios as novas tecnologias impõem aos educadores em sua formação?
Lucia Santaella: Tecnologias que importam para a educação são tecnologias de linguagem. A primeira tecnologia de linguagem é o aparelho fonador, que se instalou em nosso próprio corpo por uma questão de sobrevivência adaptativa da espécie humana. Era essa tecnologia que se empregava nas sociedades tribais para a transmissão das narrativas necessárias à preservação de suas culturas. Um grande avanço se deu com a implantação do alfabeto no mundo grego, quando se instaurou a escrita no mundo ocidental. É devido a isso que estamos lendo os gregos até hoje. Outro avanço ocorreu com a invenção da prensa manual de Gutenberg (em meados do século XV), que possibilitou a criação disto que passamos a chamar de livro: linguagem impressa em folhas sequenciais de papel encadernado. A explosão do livro viria com a revolução industrial no século XIX, que permitiu a aceleração da impressão em máquinas rotatórias. Foi também no século XIX que surgiu o modelo de escola que atravessou uma boa parte do século XX, um modelo cada vez mais adaptado ao desenvolvimento de competências e especializações para atender às necessidades do mercado de trabalho capitalista. Trata-se de um modelo escolar baseado na atomização dos campos do conhecimento e centrado no saber do professor e na transmissão desse saber por meio de exposições orais e livros-textos.
Com o advento do rádio e da televisão, que são meios não apenas noticiosos, mas, sobretudo, de entretenimento, a escola e especialmente o livro começaram a sofrer a competição dessas tecnologias de linguagem mais rápidas e mais afeitas a repertórios de informação médios, inclusive acessíveis a pessoas de baixa escolaridade. Essa competição não chegou a abalar o modelo escolar vigente. Ambos passaram a conviver em paralelo. Foi essa época que viu nascerem processos de ensino complementares via TV educativa, com eficácia bastante discutível. Foi só a partir dos anos 1990, quando a cultura do computador passou a cada vez mais fazer parte da vida da sociedade em geral, que surgiriam as grandes revoluções nas tecnologias de linguagem, com o manancial de desafios que estão trazendo para os modelos tradicionais de educação.
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