Educadora critica hipocrisia da escola que, no discurso, valoriza o erro e, na prática pedagógica do dia a dia, o recrimina e lhe atribui valor negativo, em vez de usá-lo como estratégia educativa.
Por: Vera Rita da Costa
Muitas vezes sem querer, contribuímos para que a visão socialmente instituída de que ‘errar é vergonhoso’ se perpetue e inibimos iniciativas que poderiam levar à mudança. (foto: Eduardo Gibba/ Sxc.hu)
São várias as mensagens em nossa cultura que visam amenizar o erro. Diante de situações que o envolvem, seja de nossa parte ou de outro, é comum ouvir-se, por exemplo, que “errar é humano” ou, ainda, que “ninguém nasce sabendo”. Mas será que de fato somos tolerantes ao erro? Com 'tolerantes' quero dizer se, ao buscarmos lidar com uma situação que envolve o erro, estaríamos realmente reconhecendo o seu valor intrínseco ou praticando apenas uma convenção social.
Essa questão-chave tem perturbado meu sono há algum tempo, pois tenho ouvido com frequência entre colegas professores a afirmação de que é preciso “valorizar os erros dos alunos”. Na prática, no entanto, o que observo é totalmente diferente: o que predomina, ainda, é a punição ou, usando uma expressão mais amena, a atribuição de valor ao que o aluno produz com base em uma escala que envolve apenas os conceitos de certo ou errado (e, em alguns casos mais raros, o ‘meio certo’).
Parece que o enfoque dado ao erro em nossa vida diária, sobretudo na escola, é mais uma hipocrisia do discurso – algo que se diz ser feito, mas na prática não acontece
Agrava ainda mais essa situação o processo de avaliação usado. Aquele que deveria ser um processo amplo e global, considerando também o processo de elaboração do conhecimento, reduz-se em geral a avaliar a produção final, ou seja, apenas o resultado do que é realizado (o quê) em detrimento do processo (como). E, isso, em termos de tudo ou nada, de certo ou errado.
Em outras palavras, parece-me que o enfoque dado ao erro em nossa vida diária, sobretudo na escola, é mais uma hipocrisia do discurso – algo que se diz ser feito, mas na prática não acontece. Não me parece que, sobretudo na prática pedagógica cotidiana, já estejamos dando ao erro o merecido valor que ele tem, aceitando-o e ‘partindo’ dele para melhor elaborar conhecimentos (ou, ultrapassando os muros da escola, para melhorar as nossas relações com os demais em nossa vida cotidiana, por exemplo).
É ruim, feio, pecado
Ao contrário, a impressão que tenho é que, apesar de todo o conhecimento existente sobre por que cometemos erros (o que deveria redundar em uma real valorização do erro como estratégia pedagógica), ainda predomina entre nós a velha ideia de que errar é ruim, é feio, é, decididamente, um pecado. Errar ainda é visto como desviar-se do certo. Mas o que é o certo, nesse caso, senão o padrão estabelecido e que se quer mudar?
Em consequência, também nosso sistema de avaliação (baseado apenas nos resultados finais e em verificar erros e acertos) encontra-se limitado, oferecendo uma visão bem restrita do que é, de fato, a aprendizagem. O valor do aluno (e de sua aprendizagem) encontra-se reduzido, assim, à verificação de sua correspondência ou não ao que está previamente definido. E o que está previamente estabelecido, nesse caso, é aquilo a que nos acostumamos na educação tradicional. Ou seja, apenas a aquisição e reprodução automatizada de informação, sem que se considerem as outras dimensões também importantes da aprendizagem, como vimos discutindo aqui em outras oportunidades.
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http://cienciahoje.uol.com.br/alo-professor/intervalo/2014/04/oportunidade-de-aprender
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