Da Redação - Marianna Marimon
Foto: Reprodução
Seu coração era do tamanho de todas as mães que passaram por essa terra. Em seu coração, cabiam todos os exilados, desabrigados, pobres, maltrapilhos, os escravos. Em seu coração, havia a igualdade e bondade que deveria haver em todos os outros corações. Em seu coração, gritava alto o sentimento de busca pela liberdade, e de acreditar que existe sim, a possibilidade de ser feliz em um mundo injusto e cruel. Seu coração nunca se calou diante das atrocidades humanas. Seu coração lutou até quando pode, porque parar nunca foi uma opção. Alguns duvidam da sua existência enquanto outros cultivam o mito entorno da sua figura lendária para que a esperança seja sempre revigorada com a sua história ousada. O seu nome? Não sabemos. Só podemos chamá-la de Mãe Bonifácia.
Leia também: O poeta-andarilho e mendigo, que fazia músicas e poemas para Cuiabá, virou nome de parque: Zé Bolo Flô
Ela se tornou uma lenda em Cuiabá. Mas é recorrente muitos duvidarem da veracidade da sua história, afinal, no século 19, uma mulher negra e escrava, que auxiliava a fuga dos outros escravos, parece ser ficção. Porque deixariam Mãe Bonifácia livre, enquanto todos os outros estavam encarcerados? A resposta quem dá é o historiador Aníbal Alencastro, que rememorou a história da negra escrava no livro “Cuiabá: histórias, crônicas e lendas”.
A história de Mãe Bonifácia marcou mesmo já no fim da sua vida. Aníbal conta que a velha negra e escrava parou de ser incomodada devido a idade avançada e ao deixarem de usar seus serviços, foi morar na saída para a Estrada da Guia, em um barracão em frente ao 44º Batalhão e também era ali que nascia o córrego, que viria a ter o mesmo nome “Mãe Bonifácia”.
Curandeira, africana, com um vasto conhecimento sobre as plantas. Mas, porque a sua história marcou tanto? A estátua que hoje se situa no parque que leva o nome da mãe negra, retrata bem a conduta de Mãe Bonifácia diante dos fracos e oprimidos. Ela curava os negros, os salvava da perseguição e os guiava pelo rio até o quilombo situado na mata densa, onde hoje se localiza o parque. A dor que ela sentia no peito, só podia ser esvaziada se pudesse salvar aqueles que passavam pelo mesmo sofrimento que ela: a privação da liberdade.
Quando havia revolta em Cuiabá, e os negros fugiam, era atrás da Mãe Bonifácia que iam em busca de auxílio, já que ela os escondia. A negra orientava os fugitivos a andarem pelo córrego para que os cães dos capitães do mato, não pudessem farejá-los. Com isso, Mãe Bonifácia os guiava mata adentro, até o quilombo (que depois originou o nome do Bairro do Quilombo).
Com relação aos questionamentos sobre a sua existência, Aníbal é categórico “sim, ela viveu aqui, sua história é real”. O pesquisador levantou a trajetória de Mãe Bonifácia a partir de familiares remanescentes de escravos, que até a década de 1950, os avós destes que residem atualmente, viviam no Despraiado e contavam a história da negra velha que ajudava os escravos. Os refugiados também chegaram a ser retratados em livro de Estevão de Mendonça.
A Lei Áurea só foi aprovada em 1888, já no fim do século 19, quando Cuiabá era apenas a região do Centro, da Prainha, com o ouro a jorrar das águas, com a exploração do garimpo em pleno vapor e a exploração do trabalho escravo também. O ouro resplandecia mas, era preciso um olhar atento, para entrever que era também a ruína, a escuridão, a morte que espreitava os negros exauridos pelo trabalho árduo, pelas injustiças, surras, e ver seu corpo valer menos que a sua própria vida.
Os descendentes dos refugiados ainda estão na Estrada do Despraiado. Há um fundo de verdade sobre Mãe Bonifácia. Aníbal ressalta a importância de se manter viva a sua história e memória, “é a nossa raiz, os negros que fizeram Cuiabá em seus primórdios, com as minas de ouro e as mucamas nas casas dos patrões”.
O título de mãe é justamente por isto: por abraçar a desigualdade, romper com os padrões vigentes e abrigar em seu coração toda a dor humana. A estátua é a única representação que sobrou dos seus dias de vida. A mãe negra abraça o filho escravo, mas não é o sangue que a liga a todos os homens, é a sua alma, o seu coração que precisa estancar a dor e acalentar o choro, curar a diferença com amor, com solidariedade, com esperança. Sua história deve ser perpetuada como o único retrato que sobrou envolto em toda a lenda: a mão aberta, estendida, para salvar aqueles que eram expurgados da própria vida.
A mão estendida, o peito aberto e o amor de mãe foram o que a eternizou. E a sua lição é o que nos sobrou: amar independente de todas as adversidades e acreditar que através de nossas próprias mãos, um mundo melhor é possível, basta lutar.
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Ela se tornou uma lenda em Cuiabá. Mas é recorrente muitos duvidarem da veracidade da sua história, afinal, no século 19, uma mulher negra e escrava, que auxiliava a fuga dos outros escravos, parece ser ficção. Porque deixariam Mãe Bonifácia livre, enquanto todos os outros estavam encarcerados? A resposta quem dá é o historiador Aníbal Alencastro, que rememorou a história da negra escrava no livro “Cuiabá: histórias, crônicas e lendas”.
A história de Mãe Bonifácia marcou mesmo já no fim da sua vida. Aníbal conta que a velha negra e escrava parou de ser incomodada devido a idade avançada e ao deixarem de usar seus serviços, foi morar na saída para a Estrada da Guia, em um barracão em frente ao 44º Batalhão e também era ali que nascia o córrego, que viria a ter o mesmo nome “Mãe Bonifácia”.
Curandeira, africana, com um vasto conhecimento sobre as plantas. Mas, porque a sua história marcou tanto? A estátua que hoje se situa no parque que leva o nome da mãe negra, retrata bem a conduta de Mãe Bonifácia diante dos fracos e oprimidos. Ela curava os negros, os salvava da perseguição e os guiava pelo rio até o quilombo situado na mata densa, onde hoje se localiza o parque. A dor que ela sentia no peito, só podia ser esvaziada se pudesse salvar aqueles que passavam pelo mesmo sofrimento que ela: a privação da liberdade.
Quando havia revolta em Cuiabá, e os negros fugiam, era atrás da Mãe Bonifácia que iam em busca de auxílio, já que ela os escondia. A negra orientava os fugitivos a andarem pelo córrego para que os cães dos capitães do mato, não pudessem farejá-los. Com isso, Mãe Bonifácia os guiava mata adentro, até o quilombo (que depois originou o nome do Bairro do Quilombo).
Com relação aos questionamentos sobre a sua existência, Aníbal é categórico “sim, ela viveu aqui, sua história é real”. O pesquisador levantou a trajetória de Mãe Bonifácia a partir de familiares remanescentes de escravos, que até a década de 1950, os avós destes que residem atualmente, viviam no Despraiado e contavam a história da negra velha que ajudava os escravos. Os refugiados também chegaram a ser retratados em livro de Estevão de Mendonça.
A Lei Áurea só foi aprovada em 1888, já no fim do século 19, quando Cuiabá era apenas a região do Centro, da Prainha, com o ouro a jorrar das águas, com a exploração do garimpo em pleno vapor e a exploração do trabalho escravo também. O ouro resplandecia mas, era preciso um olhar atento, para entrever que era também a ruína, a escuridão, a morte que espreitava os negros exauridos pelo trabalho árduo, pelas injustiças, surras, e ver seu corpo valer menos que a sua própria vida.
Os descendentes dos refugiados ainda estão na Estrada do Despraiado. Há um fundo de verdade sobre Mãe Bonifácia. Aníbal ressalta a importância de se manter viva a sua história e memória, “é a nossa raiz, os negros que fizeram Cuiabá em seus primórdios, com as minas de ouro e as mucamas nas casas dos patrões”.
O título de mãe é justamente por isto: por abraçar a desigualdade, romper com os padrões vigentes e abrigar em seu coração toda a dor humana. A estátua é a única representação que sobrou dos seus dias de vida. A mãe negra abraça o filho escravo, mas não é o sangue que a liga a todos os homens, é a sua alma, o seu coração que precisa estancar a dor e acalentar o choro, curar a diferença com amor, com solidariedade, com esperança. Sua história deve ser perpetuada como o único retrato que sobrou envolto em toda a lenda: a mão aberta, estendida, para salvar aqueles que eram expurgados da própria vida.
A mão estendida, o peito aberto e o amor de mãe foram o que a eternizou. E a sua lição é o que nos sobrou: amar independente de todas as adversidades e acreditar que através de nossas próprias mãos, um mundo melhor é possível, basta lutar.
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