A Ação Educativa lançou neste mês um estudo que traz um panorama sobre os Recursos Educacionais Abertos (REA) no Brasil, com o objetivo de identificar oportunidades e desafios para o uso e a apropriação desses recursos em língua portuguesa. Realizado entre março e agosto de 2014, com apoio da Wikimedia Foundation, o mapeamento “Recursos Educacionais Abertos no Brasil: o campo, os recursos e sua apropriação em sala de aula“, analisou 22 portais de recursos educacionais online e entrevistou 30 pessoas, entre pensadores que lidam direta ou indiretamente com REA, produtores de conteúdos educacionais digitais e gestores públicos.
Jamila Venturini, coordenadora da pesquisa, explica que o conceito de REA está ligado à ideia de acesso, uso, adaptação e redistribuição gratuitos por terceiros, mediante nenhuma ou poucas restrições. Dados do estudo mostram, no entanto, que grande parte dos recursos disponíveis nos portais analisados não possui licenças que permitam aplicar esse conceito na prática.
Dos 231 materiais analisados, 43,7% possuem direito autoral padrão (todos os direitos reservados), 13,4% apresentam direito autoral padrão, mas com intenção de flexibilizar, 22% optaram por um licenciamento flexível, mas que não permite o uso do material para fins comerciais, e 10,8% são de domínio público, enquanto apenas 4,3% oferecem os recursos de forma totalmente livre.
“Quando falamos em licença autoral padrão com a intenção de flexibilizar, na prática são recursos que têm todos os seus direitos reservados. Há várias iniciativas, tanto públicas como privadas, que manifestam em sua descrição e missão a intenção de fazer esses conteúdos circularem e de promover o direito à educação, mas elas precisam usar licenças apropriadas para dar segurança ao usuário”, pontua Jamila.
A pesquisadora acrescenta que existe uma confusão sobre a ideia de abertura e acesso. Um dos entrevistados, por exemplo, afirmou que seus conteúdos são abertos como na TV aberta, pois podem ser acessados. “Os REA estão embasados na circulação livre do conhecimento. Falamos em abertura no sentido de se apropriar realmente daquele conteúdo, e não apenas consumi-lo”, esclarece.
Transformação da escola
A ideia de que a instituição escolar deve ser transformada é um dos pontos centrais da pesquisa e há um consenso entre os entrevistados de que os REA podem colaborar positivamente com essa mudança, que afetaria as estruturas escolares. “Muitos entrevistados pontuaram que essa transformação tem a ver com uma mudança na cultura escolar, na relação entre professor e aluno e na superação da recepção e transmissão do conhecimento”, destaca Jamila.
Alessandro Freitas, professor de história da rede estadual de São Paulo, concorda que a visão dentro da sala de aula precisa ser renovada. Para ele, o modelo atual acaba sendo uma forma de agressão à realidade dos alunos, que não veem mais sentido na escola, e provoca um desgaste entre os jovens e os professores.
“Os alunos têm fora da escola uma vida cercada por tecnologia e quando ele entra na sala de aula é obrigado a largar tudo aquilo que faz parte da vida dele. Muitas pessoas têm uma visão pessimista de que o aluno não quer mais aprender. Não é bem assim. A partir do momento em que o aluno consegue se identificar com aquilo, ele vai pesquisar, se aprofundar e dar os resultados esperados”, pondera.
Professor autor
A possibilidade de criar um material com o qual tenha identificação é uma das vantagens dos Recursos Educacionais Abertos, na opinião de Alessandro Freitas. “O material didático é feito sem a participação do professor e do próprio aluno, que são os principais sujeitos da educação. Muitas vezes não há identificação com aquele material e o professor é obrigado a usá-lo, mesmo discordando da visão de um autor”, afirma. O professor de história acredita que selecionar esses materiais e adaptá-los junto com os alunos, daria a chance aos professores de se aproximar dos estudantes, além de inserir os jovens no centro do aprendizado.
Segundo Priscila Gonsales, diretora-executiva do Instituto Educadigital e membro da comunidade REA Brasil, os professores têm usado frequentemente objetos digitais gratuitos e até mesmo criado novos recursos, mas eles compartilham pouco aquilo o que produzem.
Dados da pesquisa TIC Educação de 2013, realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), confirmam a fala de Priscila. Do total de professores de educação básica entrevistados, 96% utilizaram recursos online para elaborar suas aulas e 88% deles fizeram adaptações no conteúdo. No entanto, apenas 21% dos educadores publicaram seus materiais.
“Os professores não se reconhecem como autores. A autoria vem sempre de fora para dizer como o professor tem que dar aula. Por isso é importante valorizar o ponto de vista pedagógico que os REA e a cultural digital proporcionam” , afirma Priscila. O grande desafio, para ela, é que os professores entendam melhor como usar esses recursos digitais para também se tornarem produtores de conteúdo.
Autor: Revista Educação
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