John Deasy, superintendente de educação do distrito de Los Angeles, testemunha na Justiça durante o julgamento do caso "Vergara versus Califórnia" (Monica Almeida/AP) |
Saiba mais sobre o caso A batalha judicial conhecida com Vergara versus Califórnia começou em 2012 com uma ação movida por nove estudantes do Estado — entre eles, as irmãs Beatriz e Elizabeth Vergara, alunas de Los Angeles que acabaram cedendo o sobrenome ao caso. Durante o processo, os estudantes foram apoiados pela ONG Student Matter, criada em 2010 pelo magnata das telecomunicações David Welch, que contratou seis advogados de um dos mais renomados escritórios de advocacia dos Estados Unidos para assumir a causa. Antes de proferir o veredicto, a Justiça ouviu depoimento de mais de 30 pessoas.
Em 2012, nove estudantes da Califórnia pediram na Justiça a revogação da lei que dificultava a demissão de professores de escolas públicas do Estado. O objetivo era impedir que maus docentes continuassem atuando em sala de aula. Há três semanas, veio o veredito favorável — e inédito — da Suprema Corte da Califórnia, elogiado pelo Departamento de Educação dos Estados Unidos e criticado pelos sindicatos. "A questão central não é demitir ou não maus professores, mas garantir ensino de qualidade às crianças. É um direito constitucional", diz John Deasy, superintendente de Educação de Los Angeles, que testemunhou no processo em favor dos estudantes. Deasy chefia a maior rede de escolas públicas da Califórnia e segunda maior dos Estados Unidos, com 1.300 escolas, 27.800 professores e mais de 900.000 alunos (a cidade de São Paulo tem 3.154 escolas, cerca de 59.856 professores e 932.174 estudantes). Apesar da decisão judicial, vai demorar até que o primeiro professor seja demitido por mau desempenho. Antes, sindicatos devem recorrer da decisão e legisladores precisam pavimentar a via legal até a demissão. Isso não diminiu a importância do veredicto, diz Deasy. "Essa é a maior decisão já tomada na área de educação na Califórnia. Faremos o possível para levá-la adiante." Na entrevista a seguir, ele conta por que abraçou a causa e como devem ser avaliados os professores, uma tarefa necessária para apontar quem sabe ou não ensinar.
Por que o senhor testemunhou na Justiça em defesa dos estudantes? Há situações em que precisamos escolher uma verdade e nos apoiar nela. O pedido dos nove estudantes tinha muito mais a ver com a garantia dos direitos dos estudantes do que com a redução dos benefícios dos professores. Por isso, decidi apoiá-los. Os professores querem fazer um bom trabalho, mas não apreciam quando alguém quer observar suas aulas, ainda mais com base em leis e regras que eles acreditam ferir sua autonomia. Ainda assim, não acho que esse seja o único ponto para melhorar a qualidade da educação. Precisamos de bons funcionários ao mesmo tempo em que devemos oferecer boas condições de trabalho a eles. Há um número enorme de professores fazendo um excelente trabalho. Após meu testemunho, recebi apoio de um grande grupo, incluindo pais e estudantes, que ficou feliz com a decisão. Houve, é claro, um grupo que ficou desapontado com o resultado: os sindicatos.
O senhor previa a reação negativa dessas entidades? Sim, sabia do risco. E logo após a decisão, os sindicatos anunciaram que vão recorrer da decisão. Estão em seu direito. Qualquer um pode fazer uma apelação à Suprema Corte, inclusive o Estado, que era o acusado em questão. Até o momento, não fizeram. Acredito, porém, que antes haverá negociação entre as partes, o Estado e os sindicatos, com quem o governo mantém boas relações. Desde que assumi o cargo, em 2011, não enfrentamos greves de professores. Houve uma ameaça em 2012, mas não se efetivou. A relação com esses grupos é boa.
Quando a decisão da Justiça deve começar a ser posta em prática? Infelizmente, não antes de dois ou três anos, uma vez que há margem de apelação de ambas as partes. Se isso acontecer, teremos que percorrer um novo e longo caminho na Justiça. O caso cresceu tanto que não sabemos ao certo quantas organizações nos apoiam e quantas estão dispostas a apelar na Corte.
O que a administração de Los Angeles terá de fazer para colocar a medida em prática? Essa é uma das partes do dilema desse caso: a lei não foi alterada ainda. O embasamento que temos é a decisão da Justiça, mas não sabemos em que situações poderemos usar o embasamento judicial para demitir um professor. Primeiro, precisamos esperar que o Estado mude o código de educação em vigor, para só assim colocar a medida em prática. Os legisladores precisão agora fazer novas leis para que a decisão entre em vigor de fato. Isso toma anos de debates e votações e não há nenhum projeto consistente encaminhado. Considero essa a maior decisão já tomada na área da educação na Califórnia. Faremos o possível para levá-la adiante.
Afinal, do ponto de vista do ensino, qual é o problema com os professores que justifique a luta pela quebra da estabilidade deles? É importante dizer que as dificuldades que enfrentamos com alguns professores não são específicas de Los Angeles. Com as regras vigentes no código de educação da Califórnia, é praticamente impossível demitir um professor, salvo em certas razões específicas como abandono de trabalho ou agressão. E esse processo custa muito caro: 400.000 dólares, em média. Se a demissão for motivada por ineficiência do docente, o processo custará ainda mais e poderá levar anos. Se tentarmos demitir um professor que não sabe ensinar matemática, por exemplo, mesmo sendo essa a sua disciplina, os sindicatos vão apelar incessantemente até esgotarem as possibilidades.
O que o senhor quer dizer exatamente quando fala em ineficiência do professor? Quando falamos de eficiência e ineficiência de um professor precisamos considerar três fatores. Primeiro, ele deve ter conhecimento do conteúdo que irá ensinar. Segundo, ser licenciado para lecionar. Terceiro, saber como proceder para garantir o sucesso da turma, com todos os fatores que cabem nessa questão: como o professor gerencia a aula, como ele apresenta os conteúdos etc. Ineficiência é o oposto disso.
Como Los Angeles mede a eficiência ou ineficiência dos professores? Temos uma avaliação anual que mede as habilidades dos docentes: como ele dá aula, qual o desempenho dos estudantes em sala e outros pontos específicos. No caso dos professores em estágio probatório, período de treinamento que dura dezesseis meses, eles ganham estabilidade no cargo antes da segunda avaliação anual, ainda que passem por um exame final do curso de formação. Esse é um dos pontos questionados no distrito e que devemos revisar em breve.
Nos últimos cinco anos, o desempenho de estudantes de Los Angeles melhorou consideravelmente em avaliações nacionais e estaduais. A que fatores o senhor atribui isso?Estou muito orgulhoso dos resultados. O desemprenho dos estudantes tem melhorado significativamente. Acredito que muito disso se deve ao fato de termos focado em metodologias de ensino, ao sistema de avaliação de professores e à ênfase na necessidade de termos bons docentes nas escolas, que inclui o desenvolvimento profissional desses funcionários. Também tem grande influência na melhora a busca por novos talentos, que fazemos em universidades que formam professores.
Que trabalho é feito para o aprimoramento dos professores? Em geral, são atividades de formação continuada. Em Los Angeles, 97,6% dos estudantes não falam inglês em casa. Em 93,4% dos casos, fala-se espanhol. Ao todo, são 92 idiomas e dialetos usados pelos estudantes das escolas públicas. Por isso, precisamos formar professores para trabalhar tanto o ensino dos conteúdos curriculares quanto o do inglês. Colocamos grande ênfase nesse tipo de trabalho e acredito que essa também é uma das razões de estarmos avançando.
http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/demitir-professores-ineficientes-e-uma-decisao-correta
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