sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Mal-estar docente




Paulo de Camargo

Na sala de aula, o professor tenta vencer o barulho dos alunos e a indisciplina enquanto explica o conteúdo de sua matéria. Em seu corpo, cordas vocais estressadas pela vibração em alta frequência por horas. Ouvidos submetidos constantemente a sons acima do limite adequado para o trabalho. Tendões sobrecarregados e músculos cansados por estar em pé horas a fio, todos os dias, ao longo dos anos. Acrescente a esse quadro a administração constante de conflitos. Por fim, o retorno muitas vezes é parco, os salários são baixos e, mais, a sociedade observa atenta seu trabalho, reiterando que dele depende o futuro do país. 

Ainda que muitas profissões exijam do corpo humano um sobre-esforço, a vida profissional dos docentes vem chamando a atenção dos pesquisadores. As doenças funcionais dos professores explicam, pelo menos em parte, o elevado absenteísmo de algumas redes. 

Recentemente, por exemplo, a imprensa noticiou que cada professor da rede estadual de São Paulo falta, em média, 21 aulas por ano utilizando licenças de saúde. São quase mil aulas que deixam de ser dadas por dia. Na rede municipal de São Paulo, o problema não é diferente: cálculos de 2013 apontam para 1,8 milhão de faltas, metade por problemas médicos.

As estatísticas ainda são imprecisas, até porque dependem de análises cruzadas entre saúde e educação. Também é difícil isolar as doenças preexistentes e as originadas por questões pessoais daquelas advindas das dificuldades no contexto de trabalho, e deve-se considerar que muitas vezes as licenças médicas são usadas como álibis para a ausência por outros motivos. Mas os estudos, realizados principalmente nos últimos 10 anos, não deixam dúvidas. "A saúde do professor deve ser entendida como um problema da educação e da saúde, e o quadro é muito grave", atesta a psicóloga Flávia Gonçalves da Silva, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Estudiosa do tema, ela realiza oficinas com os professores de Diamantina para identificar os fatores que agravam seus problemas de saúde e aumentar sua consciência corporal.

Nesse contexto, o tema vem sendo inserido no quadro das reivindicações das entidades sindicais. No ano passado, o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) publicou o livro A saúde dos professores, compilando diversos estudos sobre a questão e apresentando os resultados de um levantamento feito com 936 docentes presentes a um evento da categoria. Dentre os entrevistados, 27% tinham se afastado do trabalho por motivos de saúde nos 12 meses anteriores ao estudo.

Para Cleuza Repulho, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e secretária municipal de São Bernardo do Campo (SP), é preciso ter muito cuidado também para não tratar o professor como vítima. "Há muitas profissões que exigem bastante das pessoas, e todo docente sabe o que enfrentará, quando escolhe a profissão. Não podemos perder de vista que são as crianças que mais perdem quando o professor falta às aulas", pondera, 
preocupada com o elevado absenteísmo verificado em todas as redes. Para ela, os que ficam realmente doentes são justamente aqueles que mais fazem questão de dar aulas e demonstram compromisso com a sala de aula.

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http://revistaescolapublica.uol.com.br/textos/35/mal-estar-docente-300042-1.asp

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