terça-feira, 16 de setembro de 2014

Soneto da Educação, uma entrevista com Cristovam Buarque

Em entrevista, Cristovam Buarque, ex-ministro da Educação e hoje senador, comenta o protagonismo da Educação no desenvolvimento do país

Fonte: Revista Época
De repente, não mais que de repente, fez-se de inteligente o ignorante, fez-se de próximo o distante, fez-se da Educação uma aventura edificante. De repente, todos os candidatos à Presidência só falam naquilo: Educação. O primeiro ministro da Educação da era petista, Cristovam Buarque, pressionou Lula a fazer a revolução que, hoje, todos prometem. Caiu por isso. A seguir, uma conversa com ele, hoje senador. Para quem tem memória curta.
Época - Educação virou "prioridade" no horário eleitoral. Por que a súbita obsessão retórica?
Cristovam Buarque - A realidade mostrou que Educação é fundamental não só para cada indivíduo, mas para o desenvolvimento científico e tecnológico do país. Sem isso, a economia fica para trás, produzindo bens primários e importando bens de alta tecnologia.
Época - O que deu certo e errado nos 12 anos de governo do PT?
Cristovam - Deu certo o lento avanço na universalização, não deu certo o salto necessário para a qualidade. A Escola, ampliada, ficou para trás. Três brechas se aprofundam: entre a Educação no Brasil e noutros países, entre a Educação dos ricos e dos pobres, entre as necessidades de Educação e o que a Escola oferece.
Época- Por que o senhor saiu do governo?
Cristovam - O presidente Lula cansou de algumas falas minhas. No último encontro, eu lhe disse que não fazíamos o dever de casa para mudar a economia. O desinteresse político de Lula pelo longo prazo o levou a gestos imediatos no Ensino superior, sem dar atenção à Educação de base. O resultado foi aumento no Ensino superior, com qualidade desastrosa. Lula temia minha reação à mudança da Bolsa Escola para Bolsa Família, que perderia a conotação educacional, ao sair do MEC para o Ministério do Desenvolvimento Social. Lula usa espertamente a ideia de que é possível saltar para a universidade, sem passar pela Educação de base. E esse discurso, mesmo que demagógico, dá votos, como se comprova.
Época - Quais foram suas maiores frustrações como ministro?
Cristovam - Primeiro, a suspensão do programa para a erradicação do Analfabetismo, logo depois que saí. Também a paralisação do programa Escola Ideal, embrião da Federalização da Educação de Base. E os projetos que ficaram na gaveta da Casa Civil, entre eles o Programa de Apoio ao Estudante, que depois virou Prouni.
Época- Que nota daria ao PT, com base em nossos indicadores educacionais?
Cristovam - É fácil: a mesma nota do Ideb. Menos de 5: reprovado. Se tivéssemos levado adiante a proposta de adotar as Escolas de cidades pelo governo federal, hoje já teríamos 3 mil cidades com Educação de alta qualidade.
Época - O que acha da aprovação automática?
Cristovam - Uma medida errada. É como dar alta ao doente, porque ele ficou um tempo determinado no hospital, sem ao menos tomar a pressão dele. Serve apenas para mostrar diminuição no número de doentes.
Época - O que acha das cotas raciais?
Cristovam - Sou a favor, como medida paliativa, necessária para mudar a cor da cara da elite brasileira, enquanto se faz o certo e definitivo: negros e brancos, pobres e ricos em Escolas com a mesma qualidade.
Época - Algum modelo estrangeiro é inspiração para uma revolução na Educação?
Cristovam - Os melhores exemplos de países que partiram de níveis parecidos são Coreia do Sul e Irlanda. Para acabar com a vergonha em todas as Escolas de uma cidade, bastam poucos anos. Para fazer a mudança em todas, mais de 20.
Época - Que metas devem ser perseguidas?
Cristovam - O governo federal deveria escolher e adotar Escolas de cidades e implantar um novo sistema para substituir o atual. As Escolas federais, melhoradas, podem ser um padrão a espalhar. Uma revolução na Educação de base custaria 6,4% do PIB. Um grande programa para a população adulta, entre 9% e 10%. Espero um presidente que diga: "Só descansarei quando nenhuma família precisar de Bolsa Escola".
Época - O senhor diz que a violência na Escola é produto da desvalorização do magistério. Como valorizar o Professor?
Cristovam - Criando uma Carreira Nacional dos Professores, com salário capaz de atrair para o magistério os jovens mais brilhantes do Ensino superior. Para isso, precisamos pagar R$ 9.500 por mês. Escolher esses Professores de maneira rigorosa, exigir dedicação exclusiva e submetê-los a avaliações para substituir quem não tiver o desempenho desejado. Fazer Escolas bonitas e confortáveis, equipadas com a mais moderna tecnologia. Todas em horário integral.
http://www.todospelaeducacao.org.br/educacao-na-midia/indice/31371/soneto-da-educacao/

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